Outer Wilds e como lidamos com o desconhecido

Enquanto a curiosidade nos move para compreender o mundo, nos direciona a perigos diante de sua indiferença

Erick Lúdico
4 min readOct 19, 2019

Depois de alguns meses de espera, finalmente pude jogar Outer Wilds, título indie desenvolvido pela Mobius Digital, até então ele só havia sido lançado para XBOX One e a loja da Epic Games. Outer Wilds já tinha me chamado certa atenção, mas quando meu ídolo dos joguinhos, André Campos do jogabilidade, falou de uma forma muito entusiasmada dele, inclusive dizendo que poderia ser seu jogo favorito de 2019, que me despertou a vontade de ver qual é a desse jogo. A partir disso, durante os meses fui esperando e finalmente pude embarcar nessa experiência.

A primeira coisa que eu posso dizer, especialmente depois de ouvir uma opinião do Lucas Zavadil do Nautilus, é que a partir da minha experiência de Outer Wilds pude notar o que me fez gostar de certos jogos e de outros não, sobretudo se tratando da grande maioria dos AAA.

“Ele é um jogo sistêmico e autoral, onde tudo funciona independente da presença do jogador

O resumo da jogatina de Outer Wilds é você explorar um sistema solar que em 22 minutos acaba, pois é o tempo que o sol explode virando uma supernova. Cada um dos planetas têm suas particularidades, vamos dizer que possuem um comportamento padrão em sua vida útil de 22 minutos, onde se alteram radicalmente, no final do ciclo alguns estão bem diferentes do que eram no início. Enquanto isso, nós como exploradores somos colocados em nossa natural insignificância, ao mesmo tempo que desvendamos os mistérios de uma raça ancestral que deixou rastros por esses planetas.

Começamos o jogo em nosso planeta, interagindo com os membros da nossa mesma raça, aprendendo a usar as mecânicas e entender os conceitos do mundo. A partir de nossa decolagem, tudo está disponível para nossa exploração, não existe uma ordem, uma indicação iconográfica, o que nos move é nossa curiosidade.

Como um explorador, ao mesmo que se tinha o engajamento em conhecer os planetas, existia também um medo, que me paralisava e impedia que fosse mais ousado. É curioso, porque em muitos jogos de terror não tive esse medo, por conta da segurança dos checkpoins, mas também se diferenciava do medo que tinha jogando um Dark Souls, onde se morresse perderia bastante almas.

O que sinto jogando Outer Wilds é um desconforto muito grande, contínuo, mesmo tendo ciência do que acontecia em cada planeta. Talvez isso tenha a ver com a indiferença do mundo do jogo em relação a mim, parece que não foi feito para mim, não sou o ser especial que vai resolver todos os problemas, destravar todo o sistema compõe esse mundo.

É como se o jogo me dissesse: se você morrer, se o sol explodir, é só começar de novo ué, estou aqui fazendo meu papel.

A gente de certa forma se desacostumou com isso. Não é que o jogo seja punitivo, mas, a curiosidade nos move independente para onde, mesmo que seja para o perigo. Os feedbacks da nossa progressão são até claros, a nave tem um registro das pistas que recolhemos e monta um esquema ligando as peças. Mas a ideia de buscarmos objetivos incertos em cenários cheio de perrengues, naturalmente pode nos paralisar.

Tinha que explorar tal lugar no planeta ‘Profundezas do Gigante’, que é todo formado de água, há vários redemoinhos e outras loucuras. Toda essa atmosfera gera uma tensão, parece que tudo de ruim pode acontecer de uma hora para outra, me sentia uma formiga tentando recolher conhecimentos importantes do lugar, evitando ao máximo ser esmagado de repente.

O desconhecido de Outer Wilds nos deixa tensos, mesmo que a gente conheça mais ou menos os caminhos, o que tem de perigoso. Existe uma ansiedade, não constante, em que mesmo no meio da loucura dos acontecimentos que parecem aleatórios, ainda tinha um medo de que podia haver algo pior.

Por algumas vezes, analisando até mesmo a minha vida, soa como algo que exista na nossa mente, um medo de nos mover por conta de riscos, que até mesmo conhecemos mais ou menos o nível, porém paralisa inexplicavelmente.

Cada planeta de Outer Wilds é uma alternativa, uma escolha que naturalmente envolve riscos, em que percebemos as oportunidades e desempenhamos o nosso papel para cumprir certos objetivos. Esse fator existe em tantos outros jogos, mas a maneira que é retratada essa indiferença do universo perante nós, causa desconforto.

Ao mesmo tempo tudo isso é muito lindo, todos esses fenômenos a contemplar, adquirir conhecimentos que norteiam a jornada, solucionar desafios e viver experiências surpreendentes e únicas. Nesse sentido, vejo o quanto um jogo tem muito a ver com o que estamos sentido durante a interação, isso serve para os títulos com gráficos muito “reais” ou os pixelizados que muitas vezes são vistos como bobinhos.

Outer Wilds pode não ser um dos mais legais de se jogar, mas com certeza, para mim, é um dos melhores jogos para entender o porquê de gostar de jogar.

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Erick Lúdico
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Written by Erick Lúdico

Designer | Mestre em Comunicação | Penso, falo, pesquiso, escrevo e etc sobre videojogos 🎮

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